Postal de Lisboa XII - O Animatógrafo do Rossio

O velho Animatógrafo do Rossio

A vinte metros do Rossio, por trás do Arco Bandeira, precisamente no n.º 229 da Rua dos Sapateiros, situa-se o Animatógrafo do Rossio. Fundado em 1907 pelos irmãos Ernesto Cardoso Correia e Joaquim Cardoso Correia, era, à época, o mais luxuoso cinema de Lisboa, o primeiro a oferecer uma lotação de 100 lugares para assistir às novas variedades que vinham de França e dos Estados Unidos da América: as fitas de cinema.
Abriu a 8 de Dezembro, com a estreia do filme "A Aventureira". A partir daí, teve as suas vicissitudes: foi palco de teatro de variedades, foi sede de companhia de teatro infantil, mas, durante a maior parte da sua vida, foi um cinema. Em 1984, estando então fechado devido à morte dos seus proprietários, a Associação Portuguesa de Realizadores de Filmes propõe este espaço para sua sede, mas tal intenção nunca veio a concretizar-se. Em 1994, reabre com espectáculos eróticos. Hoje, é a Sexilândia, com anúncio público na Internet. Sex-shop e Peep-Shows.
Fiz este pequeno historial do Animatógrafo do Rossio para que se perceba que é um espaço com uma história que se cruza com a própria história da cultura da cidade de Lisboa. Mas posso acrescentar que, além de tudo isto, o Animatógrafo do Rossio é um dos melhores exemplos de decoração urbanística no estilo Arte Nova que a cidade possui. Os relevos exteriores são executados em madeira esculpida e os azulejos que se encontram entre as portas e a bilheteira, são ornamentados por figuras femininas e motivos florais. Ainda hoje  é um edifício bonito e vêem-se frequentemente turistas a admirar e fotografar a bela fachada. É claro que, hoje, se arriscam a fotografar, por engano, algum dos frequentadores da Sexilândia, que ali entram e saiem a qualquer hora do dia. As cortinas vermelhas não enganam, e as letras em neón, que desfeiam a fachada, também não.
Não sei se é pedir muito, mas não seria boa ideia dar um destino mais digno a uma das mais antigas e luxuosas salas de cinema de Lisboa? Dra. Maria João Seixas, já que tomou conta da Cinemateca, não poderia também tomar ao seu cuidado este espaço, que bem merece voltar a ter funções na arte para que foi fundado há mais de cem anos? Tenho a certeza de que não faltariam ideias, desde a já pensada sede da Associação Portuguesa de Realizadores, até um espaço museológico dedicado à 7.ª arte.
E quanto aos lisboetas, estou certa que gostariam de passear pela Baixa e não encontrar um espaço tão cheio de história e beleza entregue a uma realidade tão... nua e crua!


Pormenor da fachada do Animatógrafo

(Fotografias de FAires)

Comentários

  1. Não conhecia este espaço, mas só de o ver transformado no que é actualmente, é uma pena imensa...e faz parte como dizes, da história da cultura da cidade... que verdadeiro desperdício...
    Beijo e bom fim-de-semana.

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  2. É uma fachada muito bonita e que retrata uma época muito própria da cidade de Lisboa. Uma pena que seja um espaço desperdiçado e não utilizado para algum fim cultural, digamos... um pouco... mais... cultural, mesmo.
    Um beijo
    Romicas

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  3. Eva
    É mesmo uma sensação de desperdício!
    Bjs e bom fds.

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  4. Romicas
    Ok, a pornografia também é cultura, outro tipo de cultura, sem dúvida. Mas este espaço merecia melhor destino. Talvez alguém nos ouça.
    Bjs

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  5. Teresa

    Adoro o Animatografo. Desde os meus tempos de estudante na pátria alfacinha que era uma passagem obrigatória cada vez que me deslocava à Baixa.

    Nunca tive a coragem de entrar (era muito tímido, já vês!) mas o exterior bastava para me deliciar.

    Toda aquela fachada Arte Nova faz-me recordar alguns edifícios que encontrei em Praga, mas nenhum tinha fachada em madeira.

    Obrigado por partilhares connosco.

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  6. Que lindo,como sempre e que pena que um lindo espaço não seja bem aproveitado,não?beijos,chica

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  7. Olá, Teresa.
    Embora não conhecendo a história daquele espaço tão bem como tu a descreves, já me tinha interrogado, tal como tu, há uns tempos atrás quando, por acaso, passei por lá.
    Esperemos....
    Bj

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  8. Admito ser uma espécie em vias de extinção!
    Casos como este entristecem-me e revoltam-me!
    Como Papagaio, também observei alguns edifícios em Praga. Como eles os preservam, protegem e utilizam em manifestações culturais! Nem o comunismo soviético os destruiu.
    Porque é a cidade que me adoptou tão maltratada!?
    BJS
    BFS

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  9. Papagaio
    Sabes que já parei muitas vezes à frente deste edifício, e já tive a tentação de lá entrar, para ver se o interior condiz em decoração com o exterior mas, confesso, nunca tive coragem!
    Bjs

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  10. Chica
    É lindo, realmente, mas tão mal aproveitado!
    Bjs

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  11. Ana
    Passando por ali (e não é difícil, dista 20 metros do Rossio!) o espaço questiona-nos mas, sabendo a história, ainda nos questiona mais, não achas?
    Bjs

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  12. Carlos
    A preservação do património não pode ter a ver com questões ideológicas, mas sim com sensibilidade cultural. Eu vou falando destas coisas na esperança de que alguém ouça. Sei que a minha voz é fraquinha, mas muitas vozes fraquinhas juntas...
    Bjs

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  13. OI Teresa
    Pela foto percebe-se a beleza do Rossio e é lamentável o descaso e a acomodação de quem cuida da arte da cidade.Temos um bairro aqui ,no Rio (Copacabana) ,conhecido no mundo todo pela beleza de sua praia e sinuosidade das montanhas que vai num crescente ficando impossível transitar a noite, serve de encontros clandestinos,( ou nao),e a oferta é feita pelas calçadas, bares e locais que já enfeiam e quando nao denigre! e nao posso achar bonito o que nao é!cada dia fica mais difícil combater, existe zilhoes de instituiões a proteger e ganhar dinheiro fácil.Onde estava aqueles a quem confiamos pra cuidar da cidade?
    vai saber...
    Teresa, um bom domingo e meus abraços

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  14. Lis
    Infelizmente, estes casos multiplicam-se pelo mundo e parece que escolhem os locais mais bonitos e emblemáticos.
    Bjs e bom domingo para ti também.

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  15. Teresa
    é uma das fachadas mais belas de Lisboa, ali escondida por trás do Arco de Bandeira.
    Quando eu vim estudar para Lisboa, ainda havia lá cinema de muito má qualidade e a preços muito baixos; mais tarde , depois do 25 de Abril, transformou-se num cinema que passava filmes porno, como o velho Olímpia, e que se transformaram em locais privilegiados de sexo homossexual gratuito, nesta Lisboa tão mutável; era curioso e estranho ver senhores, pais de família, ali entrarem, quase clandestinamente, geralmente com o jornal "A Bola" na mão (sempre dava um ar de virilidade e dava jeito para outras coisas) e sair algum tempo depois de se terem "aviado" com algum jovem...
    Depois fechou e reabriu com uma novidade em Lisboa: os "Peep Shows", ou seja senhoras a despirem-se ou casais a fazerem sexo e as pessoas iam vendo por umas janelas exteriores, indo metendo dinheiro conforme o tempo que lá passavam.
    Finalmente é uma sex-shop!
    É esta a história decadente de uma outrora bela sala de cinema, então chamado Animatógrafo...
    Beijinho.

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  16. Pinguim
    Aí está a realidade nua e crua do Animatógrafo. Já era tempo de se restituir alguma dignidade a esse belo edifício, não achas?
    Bjs
    (nem quero pensar para que é que dava jeito o jornal "A Bola"!?!)

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  17. Claro que seria.

    (Sem falsos moralismos) Em Lisboa, no nosso país, a valorização do património cultural é tão frequentemente mal tratado que até arrepia.

    Que mais dizer....

    Saudações

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  18. Vamos torcer para que o Animatógrafo seja restaurado. é bela a fachada.

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  19. JPD
    Há espaços para tudo. E este merecia um destino mais digno (sem falsos moralismos).
    Bjs

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  20. Há.dias.assim
    Vamos torcer!
    Bjs e volta sempre.

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