Sobre os Professores



Nem de propósito. Neste dia de eleições, em que se faz o balanço de quatro anos de governação e se elege um novo governo, para mais quatro anos, recebi um convite de um professor brasileiro para participar numa blogagem colectiva, tendo como tema Os professores - a sua vida, os seus problemas e as suas experiências. Isto fez-me reflectir sobre o que foi a vida dos professores portugueses durante os últimos quatro anos. Vimos as nossas carreiras e as nossas possibilidades de progressão, congeladas. O nosso horário de trabalho foi aumentado. A carga burocrática associada às nossas funções foi imensamente aumentada. A nossa carreira foi arbitrariamente dividida em duas. A idade da reforma foi adiada. Perdemos a gestão das nossas escolas. E, para coroar este percurso, o nosso sistema de avaliação foi alterado, havendo a intenção de colocar os resultados escolares dos alunos e avaliação dos nossos colegas no centro dessa avaliação. O ambiente nas escolas degradou-se. Os professores desgastaram-se. Mas não baixaram os braços e as grandes manifestações, que levaram às ruas de Lisboa a grande maioria dos professores, fizeram oscilar o Ministério da Educação. Dir-me-ão que houve algumas reformas importantes, no campo da Educação. Até admito que sim. Mas, para as fazer, não era necessário tratar tão mal uma classe profissional inteira.
Sei que os professores brasileiros se batem também pela dignificação da sua classe profissional. Por isso, tenho muito prazer em participar nesta manifestação colectiva na blogosfera.


O discurso político no campo da educação tem-se baseado no facilitismo, na necessidade económica de fazer progredir os alunos e de garantir as estatísticas de sucesso. Como eu gostaria se, em vez disso, ouvisse um discurso de início do ano escolar, por parte de algum dos nossos dirigentes, como o que Obama fez aos alunos americanos.
Transcrevo aqui alguns excertos de um discurso que deve ser lido, atentamente, na sua totalidade:

Todos vocês são bons em alguma coisa. Não há nenhum que não tenha alguma coisa a dar. E é a vocês que cabe descobrir do que se trata. É essa oportunidade que a educação vos proporciona.

Talvez tenham a capacidade de ser bons escritores - suficientemente bons para escreverem livros ou artigos para jornais -, mas se não fizerem o trabalho de Inglês podem nunca vir a sabê-lo. Talvez sejam pessoas inovadoras ou inventores - quem sabe capazes de criar o próximo iPhone ou um novo medicamento ou vacina -, mas se não fizerem o projecto de Ciências podem não vir a percebê-lo. Talvez possam vir a ser mayors ou senadores, ou juízes do Supremo Tribunal, mas se não participarem nos debates dos clubes da vossa escola podem nunca vir a sabê-lo.

No entanto, escolham o que escolherem fazer com a vossa vida, garanto-vos que não será possível a não ser que estudem. Querem ser médicos, professores ou polícias? Querem ser enfermeiros, arquitectos, advogados ou militares? Para qualquer dessas carreiras é preciso ter estudos. Não podem deixar a escola e esperar arranjar um bom emprego. Têm de trabalhar, estudar, aprender para isso.

E não é só para as vossas vidas e para o vosso futuro que isto é importante.. O que vocês fizerem com os vossos estudos vai decidir nada mais nada menos que o futuro do nosso país. Aquilo que aprenderem na escola agora vai decidir se enquanto país estaremos à altura dos desafios do futuro.

Vão precisar dos conhecimentos e das competências que se aprendem e desenvolvem nas ciências e na matemática para curar doenças como o cancro e a sida e para desenvolver novas tecnologias energéticas que protejam o ambiente. Vão precisar da penetração e do sentido crítico que se desenvolvem na história e nas ciências sociais para que deixe de haver pobres e sem-abrigo, para combater o crime e a discriminação e para tornar o nosso país mais justo e mais livre. Vão precisar da criatividade e do engenho que se desenvolvem em todas as disciplinas para criar novas empresas que criem novos empregos e desenvolvam a economia.

As vossas famílias, os vossos professores e eu estamos a fazer tudo o que podemos para assegurar que vocês têm a educação de que precisam para responder a estas perguntas. Estou a trabalhar duramente para equipar as vossas salas de aulas e pagar os vossos livros, o vosso equipamento e os computadores de que vocês precisam para estudar.. E por isso espero que trabalhem a sério este ano, que se esforcem o mais possível em tudo o que fizerem. Espero grandes coisas de todos vocês. Não nos desapontem. Não desapontem as vossas famílias e o vosso país. Façam-nos sentir orgulho em vocês. Tenho a certeza que são capazes.


Comentários

  1. Pois... mas os professores portugueses têm a memória curta, pelo que se vê...
    E não são só os professores a sentir os problemas. Muitas classes profissionais têm sido assim tratadas.
    Mas enfim... quem vota é soberano...
    Abraço.

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  2. Eu também participarei no dia 15 desta blogagem, Tereza!
    Este assunto merece a nossa atenção!
    Bjs, querida e belo post!

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  3. Teresa,

    Antes de mais nada, quero agradecer-lhe por ter aceitado o convite da blogagem coletiva, por ter divulgado o evento e inserido o selo.

    Pelo que pude observar neste texto, sua participação renderá excelentes discussões.

    Pois é, parece que a realidade cruel do professor é geral. Já ouvi falar (através de outros blogs) sobre a situação de vocês aí em Portugal.

    Aqui no Brasil, a situação também é trágica. Numa cidade do meu Estado, dois professores foram assassinados por estarem liderando um movimento de greve. Nossos salários achatam-se cada vez mais. Os alunos não são educados pelas famílias, mas elas querem que nós desempenhemos esse papel (que não é nosso). A violência nas escolas é gritante.

    Foi justamente por essas situações enfrentadas pelo professor e pelo descaso dos governantes que resolvi criar a blogagem. As sociedades têm que tomar conhecimento disso. Nossa voz tem que ecoar.

    E sei que Portugal também está saturado de tanta injustiça contra os professores. Por isso, sei que muitos blogueiros daí, além de você, irão participar.

    Mais uma vez, obrigado.

    Desejo-lhe uma ótima semana.

    Abraços.

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  4. Teresa,

    Como você não estará no país no dia 15, poderá publicar seu texto quando puder. Não tem problema. Eu ficaria triste apenas se você não pudesse participar.

    Abraços.

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  5. Os professores não querem ser o "magister dixit" de outrora, mas merecem ser respeitados e valorizados pelo seu trabalho. Estamos cansados de reformas penalizadoras! Vamos ver quem será o(a) próximo(a) ministro(a) da educação.
    Deve haver, entre os portugueses, provavelmente muitos portugueses, que pensam como Obama. Esperemos que não receiem falar, como tem sido até aqui.

    Beijinhos

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