Da economia do amor


Mas, afinal, será que o amor é viável, nos países humanos? Num mundo dominado pela economia, controlado pelos mercados, qual é o valor do amor? Não é uma mercadoria transacionável, não rende juros, não desenvolve as indústrias nem os países. Ou será que não é assim?
Gonçalo M. Tavares é um dos nossos escritores mais premiados, nos últimos tempos. Vale a pena ouvir o que ele tem a dizer a esse respeito.


138 
A vida, é certo, não será um sítio excepcional para as paixões. 
Nos países humanos, o amor mistura-se muito 
com palavras equívocas. 
0 fogo que existe numa lareira, por exemplo, 
é um fogo servil, cultural, educado. 
Uma coisa vermelha, mas mansa, 
que nos obedece. 
Só é natureza, o fogo na lareira, 
quando, vingando-se, provoca um incêndio. 
E o amor assim funciona. Mas é preferível o contrário. 

139 
É desarranjo de estratégias e planos, 
surpresa ritmada, uma ilegalidade exaltante que não prejudica 
os vizinhos. 
Mas atenção, de novo: o amor não faz bem aos países, 
não desenvolve as suas indústrias, nem a economia. 
Disso nunca tive dúvidas. E por isso é preferível não. 

140 
No entanto, qual é o país que pode impedir que o amor 
entre? Não é mercadoria traficada em caixas, 
que as caixas são objectos que se abrem ao meio 
— e é possivel, com uma lanterna, olhar lá para dentro. 

141 
0 amor não se vê como 
se fosse uma presença. 
É demasiado completo 
para ter uma forma. E como jamais 
se conseguiram obter juros de uma coisa 
que não ocupa espaço, é preferível não, 
parece-me. 

Gonçalo M. Tavares, in "Uma Viagem à Índia"


(Gonçalo M. Tavares, foto retirada do Google Images)

Comentários

  1. Olá Teresa. Que bom ter-te de volta à blogosfera.
    Beijinhos e bom fds

    ResponderEliminar
  2. Nunca li nada do escritor... e é pena! Mas não se pode ler tudo... :)

    Apesar deste mundo tão materialista, acredito que sim, que o amor chega à mesma, até porque tem imensas formas! Às vezes, também desaparece depressa... :(

    Beijocas e bom fim de semana!

    ResponderEliminar
  3. olá, Teresa

    excelente esta reflexão sobre o amor!
    afinal quem é que pode impedir que o amor entre em nossos corações? ninguém, se quisermos dar-lhe guarida...

    estive a ver os outros posts sobre o amor, lindíssimos. os meus parabéns. não tnh podido aqui vir, feri um dedo da mão direita e agr só posso escrever com a esquerda, aliás com um dedo. mas voltarei.

    bjs

    olinda

    ResponderEliminar
  4. Apesar do mundo ser dominado pelas considerações económicas, estou em crer que o amor consegue trazer uma mais-valia à nossa vida. Que o digam os comerciantes, quando se aproxima o dia de S. Valentim.
    Bjs

    ResponderEliminar
  5. Muito boa a poesia de Gonçalo M.Tavares , e eu aprecio muito sua escrita.
    O amor ah o amor Teresa, bem disse Ferreira Gullar em sua crônica que o amor é complicado e de contornos imprecisos, entre abraços e beijos há um contrato, negociável a qualquer momento até mesmo após a morte. E se nao serve ao mundo dos negócios ali está inserido, se há um povo feliz todo mundo amando , a economia prospera , e todo mundo é e vive feliz!( ? )
    que o amor verdadeiro prevaleça e desde já desejo felicidades nesse dia dos namorados na sua terra.
    com beijinhos

    ResponderEliminar
  6. Eu não consigo gostar do Gonçalo M.Tavares.
    Mea culpa...

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

A Figueira da Foz e Jorge de Sena

Cigarros, chocolates e cigarros de chocolate

Sapos e outras superstições